Relátórios de economia
27/3/2025

Brasil, mostra tua cara

Por

Cristiane Quartaroli

Um cenário marcado por desigualdades, corrupção e ambições desenfreadas...parece descrição de novela, e é! Quem não se lembra da tão famosa Vale Tudo (quem não lembra olha lá no wikipédia), televisionada nos anos 1980 e que está prestes a ser reproduzida e reapresentada em uma nova versão dos dias atuais. Mas esperem, este relatório não era para ser sobre economia? Sim, sim, caros leitores, falaremos sobre economia, pois sabemos que é o assunto mais pedido do mês e aquele que todos gostam de discutir e dar o seu pitaco, certo? Antes disso, voltemos a Vale Tudo, pois a trama discorre sobre a condição política e econômica do Brasil naquela época, 1988 para ser mais precisa, que foi marcada justamente por desigualdade, corrupção, juros elevados, recessão econômica e outras coisinhas. Ora, ora, a novela está sendo regravada mais de 35 anos depois e parece que nada mudou!

 

Nossa inflação está elevada e acima da meta; a taxa de juros deve chegar a 15% até o final do ano e, com isso, nosso crescimento deverá ficar próximo de 2% ou até abaixo disso, resultado inferior ao observado no final do ano passado (3,4%). Isso sem falar na crise institucional e de confiança que o país vem enfrentando. Além disso, as projeções pioraram muito e rapidamente. Olhando as expectativas do boletim Focus para as principais variáveis do Brasil é possível notar piora significativa para algumas das variáveis (veja na tabela1). Diante desse cenário, parece que o vale a pena ver de novo não está acontecendo apenas nas telas, mas na vida real também, em nossa economia e na percepção que os agentes têm sobre o nosso país.

Falando nisso, a percepção sobre o Brasil anda meio prejudicada já há algum tempo, desde 1988... risos nervosos! Brincadeiras à parte, tivemos alguns períodos de melhora, não podemos negar, mas recentemente a imagem que se tem de nosso país não anda lá muito boa e isso inclui a imagem institucional representada pela figura de nosso presidente. A avaliação do governo Lula segue uma tendência de queda, conforme apontado por diferentes institutos de pesquisa. A pesquisa Ipec divulgada na semana passada, por exemplo, reforça esse cenário e indica uma desaprovação de 55% do presidente, ao passo que a aprovação está em apenas 40% (ver gráfico1). Além disso, a avaliação negativa (ruim/péssimo) chegou a 41%, bem acima da positiva (ótimo/bom), que caiu para 27%. A estabilidade na parcela que classifica o governo como regular (30%) sugere que há pouco espaço para uma possível recuperação no curto prazo. Vale destacar que a queda da popularidade pode ser explicada por fatores como a dificuldade do presidente em dialogar com um eleitorado mais amplo, além de fatores macroeconômicos, como a inflação dos alimentos, que, embora não esteja em seu pior nível histórico, tem tido um peso relevante na percepção popular.

Popularidade do governo ruim gera crise institucional, afetando em cheio os indicadores de confiança que, ao nosso ver, são termômetros importantíssimos da economia de um país. Já falamos algumas vezes em outros relatórios por aqui e voltamos a repetir. Um empresário pouco confiante não tem intenção de fazer investimentos; um consumidor pouco confiante consome menos, gasta menos e o resultado disso é como se a engrenagem que movimenta o país estivesse enferrujada, fazendo a economia rodar com “o freio de mão puxado”. Para se ter uma ideia, os dados mais recentes da FGV mostram que tanto a confiança do empresariado quanto a do consumidor seguem caindo. Embora tenham oscilado um pouco no início do ano, o aumento da inflação e dos juros, somados à deterioração das expectativas acabaram trazendo esses indicadores para baixo novamente (ver gráfico2).

Com isso, nossa percepção de risco-país também não melhora. A medida de risco país é importante sob o ponto de vista dos investidores estrangeiros, principalmente. Aqueles que tem (ou teriam) alguma intenção de investir em nosso país. Nos últimos meses, o risco-país do Brasil tem se mantido em patamares elevados (ver gráfico3), refletindo a desconfiança dos investidores estrangeiros em relação aos ambientes econômico e político mencionados anteriormente. Esse aumento na percepção de risco reduza atratividade do Brasil para o capital externo, impactando diretamente ativos como a taxa de câmbio e os juros. Com a incerteza persistente, o fluxo de investimentos tende a diminuir, dificultando a recuperação econômica e ampliando a volatilidade dos mercados financeiros nacionais.

 

Conclusão: ou seja, assim como na novela, onde personagens enfrentam reviravoltas e desafios constantes, a economia brasileira parece seguir um roteiro parecido, com crises recorrentes, incertezas e promessas de mudança que nem sempre se concretizam –“quero ver quem paga, pra gente ficar assim”! O cenário atual reflete essa repetição de ciclos, em que desconfiança, inflação elevada, juros altos e instabilidade política voltam a ser os protagonistas da trama econômica. Se na ficção ainda há esperança de um final diferente, na realidade, resta saber se conseguiremos reescrever essa história ou se continuaremos assistindo ao mesmo enredo de sempre, só que em uma nova temporada.

ouça nosso podcast!

Economia do dia a dia

Um resumo dos principais acontecimentos de cada dia que podem influenciar na taxa de câmbio, tudo isso em menos de 1 minuto.

ouça agora