Relátórios de economia
20/2/2025

"Vejam esta maravilha de cenário..."

Por

Cristiane Quartaroli

Entra ano, sai ano e o assunto taxa de juros continua predominante nas rodas dos economistas, congressistas, analistas e, claro, dos taxistas! E este ano não está diferente, já que o assunto da vez continua sendo como será a evolução das taxas de juros das grandes economias, especialmente dos EUA – afinal, estamos falando da maior potência mundial. Lembrando que a taxa de juros é um dos pilares da política monetária de qualquer país e impacta diretamente vários setores da economia global. Enquanto algumas economias já iniciaram o ciclo de queda dos juros (veja gráficos 1 e 2), outras seguem na contramão (alô Brasil!) e, nos EUA, a hipótese com maior probabilidade é a de manutenção, mas com alguma dúvida no ar.

Vale lembrar que no final do ano passado o Banco Central Americano fez um movimento de redução nos juros na decisão de dezembro. Contudo, a queda foi interrompida na primeira decisão de 2025 devido à persistência inflacionária e a economia ainda aquecida, vejamos:

 

1. A inflação americana parece não estar dando trégua. Os indicadores mais recentes divulgados nos EUA voltaram a surpreender de forma negativa. Tanto o PCE (Índice de Preços ao Consumo Pessoal), quanto o CPI (Inflação ao Consumidor) tiveram resultados acima do esperado e mostram uma inflação anual ainda acima da meta estabelecida, que é de 2,0%. Para se ter ideia, a inflação anual medida pelo CPI voltou a subir em janeiro deste ano para 3,0% frente aos 2,9% observados em dezembro. Já o núcleo – que exclui os itens de alimentação e energia – permaneceu no patamar de 3,3% na comparação anual, ambos bastante acima da meta. O núcleo do PCE também segue elevado (ver gráfico3).

2. A atividade econômica, por sua vez, continua fortalecida. Embora o PIB americano tenha registrado um crescimento menor em 2024, comparado a 2023, ainda assim foi um avanço que superou as expectativas iniciais, de 2,3% a.a., com forte participação do consumo das famílias (ver gráfico4). Da mesma forma, os indicadores de mercado de trabalho seguem fortalecidos, sinalizando um quadro de atividade econômica ainda bastante aquecido. Para se ter ideia, embora a taxa de desemprego esteja em nível elevado para padrões americanos (4,0%) e o indicador de vagas abertas na economia tenha desacelerado recentemente, ainda assim, estamos falando de um nível bem distante de época sem que a economia estava em recessão. Além disso, os pedidos de auxílio-desemprego vêm desacelerando desde outubro do ano passado. O mesmo vale para os indicadores de PMIs, que permanecem acima de 50 pontos – nível que sinaliza economia em expansão (ver gráficos 5).

Diante desses fatores, a grande maioria das hipóteses se concentra em uma redução de apenas 25 p.p. para os juros americanos ao longo deste ano, levando a taxa para o intervalo de 4,25% - 4,50% ao final de 2025 (a taxa base atual está entre 4,50% e 4,75%). Lembrando que, de acordo com o monitor do Fed, calculado pelo investing.com, em meados de 2024, cerca de 50% da amostra indicavam uma queda mais acentuada até o final do ano. Entretanto, projeções mais recentes sugerem apenas um corte como mencionado acima. Há também quem considere a possibilidade de o Federal Reserve não realizar mais nenhum corte ao longo de 2025, especialmente devido às políticas comerciais e protecionista do novo governo, além de outras incertezas político-econômicas.

 

O leitor deve estar se perguntando qual a conexão dessa discussão toda acima com o comportamento do câmbio aqui no Brasil. E a resposta para aqueles que acompanham de forma mais assídua nossos conteúdos é a mesma de sempre. Enquanto a taxa de juros americana permanecer no nível atual, o fluxo de investimentos chamados especulativos continuará sendo direcionado para os EUA. Embora as economias emergentes (Alô, Brasil!) tenham taxas de juros mais atrativas, a economia americana é vista como mais segura. E juros entre 5,00% e 5,25% de uma economia vista como segura valem mais do que taxa de juros em 15,00% a.a.de uma economia que ainda enfrenta muitos desafios, sobretudo, no campo fiscal. Portanto são poucos os argumentos que asseguram o ingresso de fluxo de dólares por aqui. E se não temos dólares (ou temos menos dólares), a cotação do câmbio continua pressionada (ver gráfico 6).

Conclusão: e para quem chegou até o final da leitura, esperando e acreditando que o título deste relatório faria jus ao conteúdo, se enganou. O cenário maravilhoso continuará sendo apenas parte de um famoso samba-enredo. Na realidade, a projeção do mercado, conforme o Boletim Focus do Banco Central, indica uma taxa de câmbio próxima de US$/R$6,0 até o fim do ano. A expectativa de manutenção de juros ainda elevado nos EUA somada às incertezas que rondam a economia brasileira, especialmente no campo político e fiscal devem contribuir para a manutenção de uma percepção de risco ainda elevada para Brasil. Isso sem contar que logo menos estaremos chegando em ano eleitoral. Mas isso é assunto para o próximo carnaval!

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