Relátórios de economia
24/10/2024

Exagero, loucura ou realidade

Por

Cristiane Quartaroli

Estaríamos exagerando, tendo uma visão embaçada ou vivendo a realidade tal qual ela é? Quando olhamos única e exclusivamente para os ativos do mercado financeiro, tanto locais, quanto internacionais, a impressão que temos é que o mundo está desabando e ninguém reparou! A taxa de câmbio já subiu mais de 16% ao longo deste ano e não foi apenas aqui no Brasil, outras moedas emergentes também se depreciaram igualmente ou um pouco menos. Os índices das bolsas de valores têm oscilado mais que mar com ressaca e as curvas de juros seguem em patamar elevado e subindo, para o alto e avante. Com isso, a percepção de risco que havia melhorado muito até abril deste ano, teve uma piora significativa nos últimos meses, veja no gráfico.

Motivos não faltam para tanta “aversão ao risco” – como dizem os especialistas, economistas, taxistas e simpatizantes – hoje em dia todo mundo tem uma opinião, não é mesmo. Existe de fato uma percepção de piora global generalizada por conta da expectativa de que os juros podem voltar a subir no mundo todo, especialmente, nos EUA considerados uma das grandes potências mundiais (ao lado da não tão amiga China). E falando em China, a expectativa de menor crescimento chinês também tem sido motivo de discussão e ponto adicional de aversão ao risco mundial, já que hoje se fala em crescimento de “apenas” 5,0% para o gigante asiático neste ano. Mas vejam só quanta loucura (ou seria exagero?). Há uma histeria coletiva sobre o baixo crescimento chinês, sendo que estamos falando de uma economia que deverá crescer ao redor de 5,0% - claro que é um valor baixo para um país que costumava crescer entre 6,0 e 8,0% a.a. antes da pandemia (ver gráfico).

Mas se pensarmos em todas as medidas restritivas ao longo dos últimos anos, 5,0% parece um bom percentual, não acham? E os índices das bolsas de valores que mencionamos acima? Tudo bem que eles cederam um pouco recentemente, mas ainda assim estão todos em um patamar bastante confortável (ver gráfico). O mesmo podemos dizer das curvas de juros que, claro, podem até não estar no nível mais baixo da história em alguns países, mas ainda assim estão em um nível menor do que estavam há dois anos. Ou seja, parece que há de fato um exagero (ou seria loucura?).

Agora, olhando apenas para o nosso próprio umbigo, ou melhor, para nosso Brasil varonil, a realidade da maioria dos indicadores macroeconômicos parece estar distante de todo o exagero e/ou loucura que mencionamos acima. Veja bem, caro leitor, nosso crescimento econômico vem surpreendendo positivamente a cada novo indicador. O IBC-br recentemente divulgado, com dados do mês de agosto, mostrou crescimento de 3,1% no ano (ver gráfico) e contribuiu para impulsionar um pouco as projeções de crescimento para o final deste ano. Lembrando que no início do ano, a pesquisa Focus do Banco Central – que reúne as projeções dos economistas – apontava para um mísero crescimento de 1,5%. Hoje, as estimativas estão acima de 3,0%. Vale destacar que até o FMI revisou o crescimento brasileiro para 3,5% em relatório divulgado nesta semana. É a resiliência da economia brasileira falando mais alto.

Além disso, nossa inflação cedeu. Embora os dados mais recentes mostrem uma evolução menos positiva, temos que concordar que estamos falando hoje de uma inflação abaixo da que observávamos há um ano, por exemplo. Hoje, o IPCA acumulado em 12 meses está rodando na casa de 4,50% enquanto no início de 2023 estava ao redor de 5,80%. Nossa taxa de juros idem. Embora tenha voltado a subir na última reunião do Copom, nossa taxa básica de juros hoje está em 10,75% a.a. ante 13,50% a.a. quando chegou ao pico de alta em 2023. Em resumo, estamos crescendo mais, com inflação e juros mais baixos. Mas então por que os ativos não refletem essa melhora macroeconômica?

Difícil dizer. Sabemos que o mercado ajusta as expectativas e hoje temos algumas questões que ainda não estão bem resolvidas – eleições americanas, Guerra no Oriente Médio e cenário fiscal no Brasil. Ou seja, as expectativas estão pouco ancoradas por conta de temas que permeiam a incerteza, e incerteza gera volatilidade e aversão ao risco. De fato, só saberemos mais adiante se tudo não passou de um exagero, loucura ou se a realidade deveria ter prevalecido como verdade absoluta.

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