Por
No final do ano passado, a taxa de câmbio ultrapassou os US$/R$6,20, refletindo as incertezas globais relacionadas à transição presidencial nos Estados Unidos e à ausência de uma sinalização clara de maior rigor fiscal no Brasil. Esse cenário gerou forte pressão no mercado, com o dólar registrando alta expressiva. Entretanto, o início deste ano trouxe sinais de alívio, especialmente nas últimas semanas. Embora os riscos mencionados anteriormente ainda persistam, algumas mudanças no panorama contribuíram para a valorização do real, dentre as quais destacamos: 1. a sinalização de Donald Trump em busca de uma reaproximação com a China e 2. o recesso do Congresso Nacional, que reduziu temporariamente o ruído político doméstico. Com isso, a cotação do dólar recuou para a faixa dos US$/R$5,90. O grande questionamento que nos cabe agora é se esse alívio inicial se consolidará ou se estamos diante de uma breve pausa antes de novas turbulências. Colocaremos algumas hipóteses ao longo dos próximos parágrafos para tentarmos desvendar esse mistério.
A primeira pergunta que não quer calar é se existe a possibilidade ou não de traçarmos um paralelo entre o primeiro mandato de Trump e a administração atual. Lembrem-se de que Trump comandou a economia norte-americana entre os anos de 2017 e 2020, com direito a uma pedra, quer dizer, pandemia, no meio do caminho. Aquela época foi marcada por oscilações significativas nos principais ativos, sobretudo, na taxa de câmbio, que refletiram tanto fatores internos quanto externos. Para se ter uma ideia, no início do primeiro mandato de Trump, o dólar estava com cotação próxima de US$/R$3,25 e, ao final do mandato, já era cotado à US$/R$5,20 (já em pandemia).
Dentre os principais fatores que influenciaram o comportamento da taxa de câmbio aqui no Brasil ao longo daquele período, podemos destacar:
1. Do lado externo: a política econômica implementada por Donald Trump durante seu primeiro mandato foi marcada por medidas significativas que impactaram tanto o cenário doméstico americano, quanto o mercado global. Uma das principais características dessa política foi a adoção de práticas protecionistas (alô, acho que teremos de novo!), exemplificadas pela guerra comercial com o gigante asiático, China. Essa estratégia envolveu a imposição de tarifas sobre diversos produtos importados, o que resultou em tensões econômicas entre os dois países e gerou volatilidade nos mercados financeiros ao redor do mundo. Além disso, Trump promoveu reformas fiscais nos Estados Unidos, que incluíram cortes expressivos de impostos para empresas e indivíduos. Essas medidas, destinadas a estimular a economia interna, também tiveram como efeito o fortalecimento do dólar no mercado internacional, influenciando a competitividade global e a dinâmica das relações econômicas entre nações.
2. Do lado interno: o cenário político e econômico enfrentado pelo Brasil foi marcado por significativa instabilidade, com incertezas relacionadas a temas estruturais, como a reformada Previdência, que gerou debates prolongados e incertezas quanto à sua aprovação e impacto fiscal de longo prazo. Além disso, diversas crises fiscais em alguns estados agravaram a situação, destacando a fragilidade das finanças públicas em diferentes níveis de governo – ressalva feita à pandemia. No plano econômico, o país vivenciou uma crise interna caracterizada por uma recuperação lenta do crescimento econômico e elevada taxa de desemprego. Fatores que refletiram diretamente na qualidade de vida da população e na confiança do mercado consumidor – os indicadores de confiança ficaram bastante prejudicados naquela época. Esses fatores, somados aos momentos de aversão ao risco no cenário global, levaram à saída de investidores estrangeiros, o que contribuiu para a diminuição de capitais disponíveis, aumento da volatilidade nos mercados financeiros domésticos e pressão na nossa taxa de câmbio.
3. Globalmente: por fim, não podemos deixar que mencionar que a pandemia em 2020 intensificou a desvalorização do real, com fuga de capital para moedas mais seguras, como o dólar.
Em 2025, a volatilidade do câmbio deve permanecer como uma das principais preocupações dos mercados, reflexo das incertezas associadas ao governo Trump – já sentimos isso agora em janeiro. Diferentemente do primeiro mandato do presidente republicano, que foi marcado por flutuações cambiais mais acentuadas, desta vez há fatores que podem contribuir para moderar os impactos de uma alta muito expressiva na moeda estrangeira. Dentre esses fatores, destaca-se o diferencial de juros favorável ao Brasil. Com uma Selic mais elevada em comparação aos FED funds nos Estados Unidos, o país se torna mais atrativo para investidores internacionais, ajudando a conter a desvalorização cambial. Além disso, há a expectativa (ou seria esperança?) de que o governo brasileiro adote uma postura mais austera no campo fiscal. Sinais recentes apontam para um maior compromisso com o controle das contas públicas, o que pode reforçar a confiança no real e reduzir a pressão sobre o câmbio.
Apesar dessas condições em tese mais positivas, o cenário permanece incerto e sujeito a variações significativas, especialmente em função de fatores de mais difícil previsão, para não dizermos impossível. Assim, será crucial acompanhar de perto os desdobramentos políticos e econômicos tanto dos EUA quanto do Brasil para avaliar como esses elementos irão interagir no contexto cambial ao longo do ano. Para se ter ideia, as projeções para a taxa de câmbio, de acordo com a pesquisa Focus do Banco Central, ainda estão em patamar acima do nível atual de câmbio, sendo US$/R$6,00 para o final deste e do próximo ano. Ou seja, está todo mundo ainda com o pé atrás sobre esse cenário.
De fato, ainda há muita água para rolar até o final do ano e, se tratando do início do governo Trump, a emoção será garantida. Nos resta saber se o comportamento do dólar aqui no Brasil será mais penalizado pela volatilidade típica de um velho novo governo americano, como aconteceu entre 2017-2020 ou se irá se favorecer do ingresso de fluxo de capitais esperado por termos uma taxa de juros mais alta e mais atrativa sob o ponto de vista dos investidores. Por enquanto, a única certeza que temos é que não temos certeza de nada!
A summary of the main events of each day that may influence the exchange rate, all in less than 1 minute.
Listen now